sábado, 13 de junho de 2015

[Postagem do Dia] A Crucificação LGBTI


Atualmente, vê-se um mundo "multipolarizado" em extremismos. Cada um quer o seu quinhão no reino dos “céus”. Se, por um lado, têm-se católicas em busca da reafirmação da sua fé, correndo atrás dos fieis perdidos devido a posturas radicais passadas, deste modo, perfazendo-se a partir de discursos mais amenos; por outro, pode-se ver uma corrente evangélica que de amena não tem nada, pauta-se justamente no extremismo para arrebatar os fieis fervorosos, criam um verdadeiro exército da "fé".

Nota-se que, ultimamente, um novo polo extremista toma de conta do cotidiano brasileiro e, principalmente, dos holofotes da internet: os movimentos sociais. Combatem tudo: novela, propagandas, discursos políticos, religiosos, tudo – simplesmente – tudo. E isso poderia, facilmente, ser motivo das mais severas críticas. Mas, se por um lado, temos duas grandes referências religiosas se digladiando para ter o seu espaço, onde ficam aquelas pessoas que não são abraçadas pela sociedade? O radicalismo, portanto, dos movimentos sociais é o preço que se paga para poder (realmente) existir.

Nesse contexto, vê-se, portanto, a representação LGBTI crucificada em plena Parada Gay 2015. Diante da cena, foram-nos jogadas na cara algumas coisas: 1- peitos à vista; 2- mulher crucificada; 3- transgeneridade. A imagem é chocante, claro. Como não seria? Primeiro que a nudez representada de forma consciente choca muito mais do que nudez feminina pelo bel prazer (reafirmando a coisificação do corpo feminino). Segundo que o posto de representação da crucificação é do homem, pois foi o homem que morreu por nós, não uma mulher, o homem que se sacrifica pela sua coletividade, a mulher apenas pelo lar (representação do machismo exacerbado). Por fim, para quebrar com todas as ponderações possíveis têm-se exposta a transgeneridade, muitos se perguntavam atordoados “É um homem?” “É uma mulher?” “O que é isso?”.

Era uma mulher, nua, trans.

Era uma mulher, nua, trans e que representou a dor de um coletivo.

Era uma mulher, nua, trans e que representou a sua morte diária.

Era uma mulher, nua, trans e que disse com o seu corpo, que o corpo é dela, e que aqueles que a olhavam com olhos julgadores eram os pecadores que a crucificavam todos os dias.

Era uma mulher, nua, trans e que chamou a sociedade de "assassina".

Mas daí advieram algumas dúvidas. Voltando para o início dessa divagação que estou tendo. A parcela católica firmou um discurso mais apaziguador, apesar de condenar, apesar de ter na cruz um símbolo sagrado, tentou – em meio a um discurso machista/homofóbico – mostrar que, apesar de não concordar, o amor prevalece. Por outro lado, a parcela evangélica (em sua maioria), revoltou-se, apesar de condenar o uso de imagens e representações, apesar de não ter na cruz um símbolo sagrado, apesar disso, a manifestação de ódio foi um caso a ser estudado, foi o que gerou toda a repercussão.

Pois bem, as dúvidas:

1º O que choca mais? O fato de ser mulher na cruz? O fato de ser uma trans? Ou a nudez?

2º O que mais dói atualmente no coração das pessoas: saber que todos os dias pessoas trans são, literalmente, crucificadas? Ou a sua representação da crucificação?

3º O que ofendeu a fé do povo? O uso do objeto religioso? Ou a ousadia de uma mulher trans de gritar (sem abrir a boca) toda a violência que sofre e dizer que aqueles que se revoltam contra ela são os mesmos que estão contra si praticando violência?

O grande problema disso tudo é que aqueles que criticaram, antes de fazer, não pararam para refletir sobre algumas coisas. Por exemplo, a cruz simboliza a dor, a crueldade, a penitência. A cruz também simboliza a injustiça, o ódio profanado sem motivos, o martírio. E se a cruz simboliza tudo isso serei ousada em dizer: essa foi a representação mais fiel que já ocorreu. Pois não teve banalização, não teve insulto, não teve mentira. O motivo foi justo, honesto e de coração. A trans exteriorizou a dor de muitos, pois todos os dias, a comunidade LGBTI morre mais um pouco.

Fica, portanto, a torcida para que não haja mais esse tipo de representação: não pelo fato de não ter sido justo, não pelo fato de achar que ofendeu a fé de alguém. A torcida é latente, pois se houve o protesto, a representação, é porque o motivo é iminente. Que não haja mais motivo. Que a trans seja reconhecida como quer ser reconhecida, que o sujeito seja apenas o sujeito, o sujeito que deseja ser.


Por fim, com pesar digo, sempre que olho para a imagem da trans pregada na cruz sinto vontade de chorar e escuto um pedido de clemência. Mas, a culpada não é ela e quem deveria pedir clemência são as pessoas que lhe colocaram pregada ali, despida. Ela, apenas, nos contou da sua dor.

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