quarta-feira, 17 de junho de 2015

[Postagem do Dia] A mulher, o Legislativo e a necessidade da Cota

Nesta última terça-feira (16 de junho de 2015), como esperado, o Plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a emenda apresentada pela bancada feminina à reforma política (PEC 182/07, do Senado) que garantia um percentual de vagas no Legislativo.

Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Como funcionaria o sistema de cotas

A emenda previa uma reserva para as mulheres nas próximas três legislaturas. Funcionando da seguinte forma: Na primeira, com um total de 10%, na segunda o percentual subiria para 12% e, na terceira, para 15%. Essa parcela reservada para mulheres incidiria em relação ao total de cadeiras na Câmara dos Deputados, assembleias estaduais, câmara de vereadores e Câmara Legislativa do Distrito Federal. Caso as cotas não fossem preenchidas, seria aplicado o princípio majoritário para as vagas remanescentes.

Votação

Para que fosse aprovada a emenda, seria necessário um total de 308 votos a favor, contudo só atingiu a margem de 293 votos, 101 votos foram contrários e tiverem 53 abstenções.

Posicionamento da oposição à Emenda

Um dos deputados que se posicionou contra foi João Rodrigues (PSD-SC) que disse: “O Brasil está se transformando em País de cotas. Em estados e municípios, não é proibida a candidatura de mulher. Se criarmos cota, amanhã ou depois teremos deputadas federais eleitas com 5 mil, 10 mil ou meia dúzia de votos. (...) Não entramos aqui pelo sexo nem por opção sexual*; foi pelo trabalho, pelo empenho e pelo compromisso com a sociedade”.

*A expressão “opção sexual” é preconceituosa, a sexualidade não é uma opção, mas sim uma condição. Por isso, atualmente, denomina-se “orientação sexual” ou “condição sexual”.

Em um posicionamento ainda mais radical, o deputado Delegado Edson Moreira (PTN-MG) disse: “Cotas daqui e dali e, daqui a pouco, todos estarão fazendo cirurgia para mudar de sexo* para entrar no Congresso”.

*Falar que alguém seria capaz de mudar o sexo apenas para ter espaço no Legislativo além de preconceituoso, demonstra a falta de capacidade de representar não apenas a mulher que já nasce com o sexo biológico feminino, como também aquela que vem a ser assim considerada por identidade de gênero, com ou sem mudança de sexo.


Nota do blog

Atualmente, as mulheres ocupam, em média, 10% de cadeiras no legislativo brasileiro. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, dos/as 513 parlamentares, somente 50 são mulheres. Inclusive, há cinco estados que hoje não contam com nenhuma participação feminina no Congresso Nacional. Seria inocente apontar que essa desproporcionalidade é falta de interesse, por parte das mulheres, na participação da vida política, basta fazer uma breve retrospectiva. O que há é uma verdadeira restrição cultural e ideológica. No Brasil, a mulher só teve direito a votar a partir de 1932, direito conquistado pela bióloga Bertha Lutz, que exerceu um papel decisivo para a participação da mulher no cenário político brasileiro. Ou seja, um modelo político que até o início do século XX restringia o direito ao voto às mulheres apenas atesta o Brasil como um país machista-patriarcal. No qual, a mulher foi ensinada a não sair dos limites do lar, seja emocional ou profissionalmente.

A cultura escrita pelos homens tende, reiteradamente, favorecê-los. Não é diferente na política. O sistema de cotas não é um benefício arbitrário, sem fundamento. Mas sim, uma necessidade de inclusão e conscientização. Como as mulheres vão alcançar direitos e caminhar a passos mais largos em direção a uma isonomia de gênero se não há representação? Se não há voz? O Legislativo é a representação do cidadão, é a forma de atender as necessidades, de assegurar os direitos e a vida digna. Então, promover a oportunidade da mulher ingressar no Legislativo é assegurar às cidadãs que elas possam viver sem discriminação, sem violência psicológica ou física, é protegê-la do estupro, da ofensa, da violência doméstica/familiar, é proporcionar uma vida emocional e profissional digna. Por fim, é assegurar às mulheres a vida plena que hoje é proporcionada aos homens. Não se pode esquecer que a política (ou os políticos) na plena utilização dos mecanismos que lhe são ofertados é quem protege o cidadão e a cidadã. Logo, esse foi o grito da bancada que defendeu as cotas: a defesa da mulher.

E, mais uma vez, o Legislativo brasileiro (o mais conservador de todos os tempos, ressalta-se) nos desanima com seu discurso enrustido de preconceito.

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