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É
uma questão simples de lógica: quem estupra é o criminoso, o estuprado é a
vítima. Há mesmo que se questionar isso? O estuprador dá apenas duas opções
para a sua presa: ou você cede ou você morre. Trata-a como um bicho em abate,
ali é o seu objeto de prazer, o seu animal de caça. Prende, agride e faz dela o
que bem entende, almejando satisfazer todos os seus desejos doentios. A sociedade
pegou esses dois personagens e distorceu toda uma noção de culpado e vítima. Aos
seus olhos, o agressor é refém de uma mulher que incorpora a “Eva”, seduzindo e
provocando o seu próprio mal, como uma consequência inevitável.
Por
muito tempo a visão que foi criada da mulher vagava em dois polos distantes, em
um primeiro momento deveria se enquadrar na imagem da “Virgem, Maria”, entrando
em um conflito intenso no momento em que adentrava na maternidade, deixando de
ser inocente aos olhos críticos do meio em que estava inserida, para ser a “Eva”,
perversa, histérica e masoquista:
“O
Cristianismo, a partir da figura de Eva, instituiu uma relação entre
feminilidade, o sexo e o pecado – as mulheres como seres traiçoeiros que
atiçavam a luxúria e o ciúme, lançando os homens uns contra os outros. Consideradas
culpadas pela “queda” de Eva, no paraíso, corporificando a corrupção associada
à carne, era tidas como fracas e suscetíveis” (Pensamento de RAMINELLI, nas
palavras da Dra. Maria da Luz Olegário em sua tese de doutorado).
O
interessante é observar que essa visão que foi formado a séculos atrás, ainda
que com outra roupagem perdura até os dias atuais, atualmente esse discurso se
encobre por meio de outras feitas, a dualidade feminina ainda é colocada como
causador de diversas práticas que a agridem, as pessoas desejam guiar a forma
do outro, culpabilizam para poder manter o controle dos seus comportamentos,
vestimentas, modo de falar e de agir, tornando-se “estuprável” aos conceitos
culturais.
“Pela lógica do estupro, a mulher é sempre 'caça', 'presa'. Pela lógica do estupro pensa-se mais no 'erro' da vítima, do
que no 'erro' do criminoso. É como se a vítima fosse culpada por não ter
escapado, por não ter corrido mais rápido, por não ter desaparecido antes. Ou
por ter 'parecido' mulher demais. No Brasil e em muitos outros países, como a
Índia – para dar o exemplo do país mais estuprador do mundo – a lógica do
estupro faz com que mulheres precisem camuflar-se para sobreviver. Mas mesmo
assim, bem protegidas, elas serão estupradas.” (Márcia Tiburi em "Lógica do Estupro")
O
que acaba sendo irônico nessa matemática óbvia, é que a sociedade conseguiu inverter
os papeis, como um autor que guia a sua novela de acordo com o desejo do
público, porém estamos lidando aqui com a vida real, e a realidade neste caso
dói, sangra e deixa sequelas que repercute por toda a história daquele que está
sendo agredido.
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