quinta-feira, 25 de abril de 2013

Homens se travestem para protestar


Uma cora­josa cam­pa­nha viral na inter­net está pro­tes­tando a favor da igual­dade de gênero no Irã. O grupo no Facebook “Kurd Men For Equality” reúne fotos de homens tra­ves­ti­dos para afron­tar as ideias con­ser­va­do­ras sobre mas­cu­li­ni­dade e feminilidade.
Cerca de 150 homens cur­dos já fize­ram este “pro­testo cros­s­dres­ser” em res­posta a uma puni­ção apli­cada na pro­vín­cia de Marivan, que obriga homens con­de­na­dos a andar pelas ruas com rou­pas de mulher. Essa puni­ção tem como obje­tivo a puni­ção pela humilhação.
A cam­pa­nha Kurd Men For Equality quer mos­trar que ser mulher não é algo humi­lhante. Segundo o site GayStarNews, a humi­lha­ção pública é uma puni­ção comum no Irã. No entanto, esta é a pri­meira vez que um homem foi obri­gado a se ves­tir com uma tra­di­ci­o­nal ves­ti­menta femi­nina e andar pelas ruas.
A orga­ni­za­ção femi­nista Marivan Women’s Community pro­tes­tou con­tra a con­de­na­ção e foi às ruas. Em soli­da­ri­e­dade, um homem cha­mado Massoud Fathipour pos­tou uma foto ves­tido como mulher (ima­gem acima). Depois dele, vários outros fize­ram o mesmo, ini­ci­ando o viral.
Segundo o site Queerty, 17 depu­ta­dos ira­ni­a­nos assi­na­ram uma peti­ção ende­re­çada ao Ministério da Justiça con­de­nando a puni­ção e afir­mando que é uma “humi­lha­ção à mulher muçul­mana”. Esse Drag Race de pro­testo é uma ótima notí­cia vinda do Irã, um dos paí­ses mais homo­fó­bi­cos e con­ser­va­do­res do mundo. Por lá, a homos­se­xu­a­li­dade pode levar à pena de morte.


quarta-feira, 24 de abril de 2013

Lispector


A escritora e jornalista ucraniana, declaradamente pernambucana, nasceu em 1920. Firmou-se no cenário literário escrevendo contos e romances com a temática existencial e psicológica, que teve como foco a exploração do íntimo dos seus personagens, em especial as figuras femininas. Em suas obras é evidente a base fincada em sensações, memórias e pensamentos do personagem, invadindo cada detalhe que se passa nos lugares mais profundos de uma pessoa, fazendo, dessa forma, com que nos identifiquemos com as suas criações. A sua tática de escrita apresenta um domínio que poucos conseguem, quando transforma uma prosa em quase poesia, na utilização de metáfora, sinestesias e demais recursos que, ao lermos Clarice, temos a impressão de estar cantando uma música acobertada da mais bela harmonia. Proporcionando-nos, destarte, não apenas o conteúdo denso (que é bastante), mas também um extenso valor artístico. Outro ponto que não se passa batido em suas obras é o choque entre os valores da época, enraizados em um moralismo perturbador, para com o desejo de libertação que os seus personagens traz consigo, nos fazendo lembrar, por vezes, da eterna Jane Austen. A autora, com o talento que deposita em suas obras, conseguiu invadir diversos mercados. Recentemente, ganhou uma importante premiação norte-americana “Melhor Livro Traduzido nos Estados Unidos” dentro da categoria de ficção, isso só confirma as palavras acima proferidas. Que este nome jamais seja esquecido, Clarice Lispector.


terça-feira, 23 de abril de 2013

Marcia Tiburi


Mania de carrão


O automóvel é para poucos um meio de transporte. Produto para a indústria e o mercado, ele deve surgir como fetiche na consciência coisificada dos usuários. É dessa coisificação que depende o sucesso das vendas e o aumento da produção. O aumento da produção gera emprego, dirão uns, gera capital, dirão outros. Que o carro seja central na economia política de uma sociedade marcada pelo descaso com o transporte público explica a supremacia do privado, o poder do dinheiro em detrimento da cidadania. O núcleo bárbaro de nosso estado social refere-se também ao declínio do espaço público ocupado pelos carros em uma sociedade motorizada quando já não há por onde seguir.
É evidente que o espaço social da rua, este espaço desvalorizado onde vivem excluídos e marginalizados, moradores sem casa, se tornaria o lugar onde o capitalista motorizado ostentaria seu poder automobilizado. O motorista realiza a ideia de que a racionalidade técnica é a racionalidade da dominação por meio de sua máquina impressionante. Andar a pé, uma prática totalmente antitecnológica, tornou-se um perigo, cujo risco é deixado ao despossuído. A posse é o espaço a ser percorrido. Os carros nas grandes cidades congestionadas surgem como marcadores de lugar: quem pode mais ocupa mais espaço em relação a quem pode menos. Assim é que a sociologia do trânsito de nossa época tem que se ocupar não apenas com a divisão do espaço, mas com a tradicional avareza do capitalismo aplicada ao movimento nas grandes cidades. Não se trata mais do simples direito de cada um à cova medida; o movimento lento dos carros nas ruas enfartadas lembra o funeral em que todos estão a caminho de um grande enterro.
Fetiche automobilístico
O carro faz parte da mitologia cotidiana. Ayrton Senna foi o deus maior sacrificado no ritual do automobilismo, ritual do qual participam as massas encantadas com seus brinquedinhos mais baratos.
Mas para entender o fenômeno do fetiche automobilístico de nossos tempos podemos pensar algo ainda mais elementar: quem compra um carro nunca compra apenas um carro, compra a ideia vendida pela propaganda do carro. A ideia é sempre a mesma, compra-se um poder. Com o poder na forma de um carro, o motorista pode transitar pela rua.
Um carro permite a ostentação fundamental que se tornou meio de sobrevivência em uma sociedade competitiva na qual, mesmo não sendo um vencedor, sempre se pode parecer um. A ostentação é parte essencial do sistema simbólico em que o reconhecimento deturpado diz quem somos e o que podemos ser dependendo do que possuímos.
Do mesmo modo que o menino rico ganha um carro dos pais assim que aprende a dirigir não porque o carro seja necessário, mas porque é sinônimo do tornar-se adulto ou pelo menos do parecer adulto, o menino pobre que trabalha como empacotador no supermercado economiza dinheiro para comprar um carro porque, também ele, entende que é o carro que o torna alguém numa sociedade de pilotos. Assim, ele não questiona seu trabalho escravizado, pois pode chegar ao fim da corrida alcançando o bem desejado por todos os que, na qualidade de vencedores ou vencidos, não se colocam a questão de parar a corrida.
Assim é que entendemos o caráter de máscara dos automóveis. A questão de ser quem se é define-se no meio de transporte que se usa. Da bicicleta ao carro blindado, do ônibus que sai da periferia à Ferrari, cada um é reduzido ao transporte que usa. Quem não tem carro, pois ele está ao alcance de todos independemente dos sacrifícios implicados em sua aquisição e manutenção, pratica um ateísmo. O dono do carrão expõe, como um exibicionista expõe seu sexo, uma verdade teológica.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Santanna, o Cantador


Santanna é nordestino de Juazeiro do Norte, no Ceará, nasceu em 29 de fevereiro de 1960. O cantador mais romântico já visto teve como inspiração para adentrar no pé de serra, o eterno Rei do Baião, Luiz Gonzaga, que conheceu em 1984, tornando-se amigos. Estreitou laços e aprendeu muito com Gonzaga, fazendo diversas participações em seus shows, bem como realizando as aberturas e vocal. Apenas em 1992 tomou a cantoria como sua profissão. Pois bem, não resta dúvidas pra quem conhece o seu trabalho, que o cantador não fica nada por trás do talento do Rei do Baião, inclusive quando se trata das suas composições. Santanna deposita nas letras das suas músicas o romantismo, o sofrimento, os mais aventurados casos de amor, nos levando pra perto de quem amamos só de escutar. O poeta já é eterno no coração dos fãs e na história do forró pé de serra, merece todo o respeito do mundo, porque fiel, como ele, à boa música brasileira, poucos são. Eterno, Santanna. 

Me Dá Meu Coração - O Cantador:




quinta-feira, 18 de abril de 2013

Vargas Llosa

Extraido da Revista Cult:


Ele pode não ser universalmente admirado, mas se há uma qualidade apreciável em Mario Vargas Llosa, 76, é o tipo de coragem intelectual que o leva a criticar de Damien Hirst e John Cage a Carla Bruni em seu último livro, La civilización del espectáculo (“A civilização do espetáculo”, a ser lançado no Brasil no segundo semestre pela Alfaguara).
Na nova obra do Nobel de 2010 – que vem ao Brasil em abril para o evento Fronteiras do Pensamento e cujo romance Conversa no Catedral acaba de ser reeditado pela Alfaguara brasileira –, o polêmico artista plástico britânico Damien Hirst é descrito como um “extraordinário vendedor de mentiras”, a obra “4’33’’”, do compositor de vanguarda John Cage, é mencionada em meio a um argumento de que a arte é hoje “jogo e farsa e nada mais”, e a entrada da ex-primeira-dama da França no Palácio do Eliseu exemplifica, de acordo com o autor, como o país “sucumbiu à frivolidade universalmente imperante”. Shows de rock, mangá, a indústria de Bollywood, telenovelas brasileiras e livros digitais também têm seu valor cultural esvaziado por Llosa.
Frequentemente criticado por suas opiniões políticas conservadoras, o peruano – que concorreu à presidência de seu país em 1990, perdendo no segundo turno – sublinha, nesta coleção de ensaios, sua aversão à democratização da cultura: “Esta louvável filosofia teve o indesejado efeito de trivializar e vulgarizar a vida cultural”.
De modo consideravelmente pessimista e nostálgico, o escritor se debruça na mudança do conceito de cultura ao longo de sua vida, vendo-a como convertida em algo banal e superficial por uma sociedade hedonista que prioriza o entretenimento. Segundo ele, na sociedade de hoje, o estado de ignorância não é visto como um problema, o que leva ao conformismo e à atitude passiva da civilização.
Embora lúcida e sem dúvida relevante, a premissa soa familiar demais. O próprio Llosa não hesita em apoiar seus argumentos nos de T. S. Eliot, em Notas para uma definição de cultura (Editora Perspectiva), ou de Guy Debord, em A sociedade do espetáculo (Contraponto Editora), publicados respectivamente 65 e 46 anos atrás – as primeiras trinta de duzentas páginas do livro são dedicadas basicamente a parafrasear outros autores.
Patrimônio da elite
Como Eliot, Llosa defende a cultura como patrimônio da elite, declarando que o único modo possível de democratizá-la é nivelando-a por baixo, empobrecendo-a e tornando-a superficial – precisamente o que, segundo ele, tem acontecido nas últimas décadas. Frédéric Martel, Gilles Lipovetsky e George Steiner são alguns dos contemporâneos citados, embora nem sempre em concordância.
Enquanto Lipovetsky defende uma cultura global de que indivíduos dos cinco continentes participam, Llosa acredita que ela irá tornar as pessoas submissas e desprovidas de vontade própria. Similarmente, ao passo que o filósofo francês louva os milhões de visitantes recebidos pelo Museu do Louvre, o peruano alega que as estatísticas não representam um genuíno interesse pela cultura, mas sim “puro esnobismo”.
“Toda generalização é falaciosa e não se pode meter todos por igual no mesmo saco”, escreve, ao criticar o jornalismo sensacionalista. Contudo, muito de seu livro é baseado em generalizações – em alguns casos, embora menos recorrentes, sem uma aparente verificação de dados.
Ele menciona, por exemplo, que houve um aumento de indivíduos que são religiosos apenas ocasionalmente e da boca para fora, quando na realidade suas vidas dispensam a religião inteiramente. O argumento, porém, não possui dados que o sustentem. Em outra passagem, ele menciona Canadá e Inglaterra como os países mais cultos do mundo, sem apresentar nenhuma prova concreta para tal afirmação. O ocasional tom moralista – excedido particularmente quando diz, de novo por uso da generalização, que sexo sem amor provoca “uma sensação de fracasso e frustração” – também pode incomodar a alguns.
Embora levante questões importantes para o debate sobre os rumos da cultura hoje, o livro de Mario Vargas Llosa não deixa de ser uma sincera declaracão de amor a um tempo e cultura perdidos, a cuja substituição ele se recusa a dar crédito. Assim como o jornalista Mino Carta em recente (e polêmico) editorial à revista Carta Capital, Vargas Llosa é contra a “operação de imbecilização coletiva de espectro infindo” que sofre a sociedade contemporânea.
A seguir, Mario Vargas Llosa fala à CULT em entrevista exclusiva dada durante o festival literário Hay Festival, em Cartagena de Índias, Colômbia, no Hotel Santa Clara – local que abrigava o antigo Convento de Santa Clara, onde Gabriel García Márquez situou seu romance O amor e outros demônios.
CULT – Muitas pessoas já escreveram sobre a sociedade do espetáculo antes, notavelmente Guy Debord. Que nova luz o senhor está trazendo para esse assunto?
Mario Vargas Llosa – É um ensaio sobre um aspecto da sociedade do espectáculo: a transformação do conteúdo da palavra cultura. Há cinquenta anos, associávamos a palavra à literatura, artes plásticas, músicas, balé, história, ciências humanas. Creio que essa noção de cultura se transformou completamente, mais precisamente nos últimos trinta anos, digamos. A palavra cultura se associou com coisas que tradicionalmente não formavam parte da cultura e sim do entretenimento, da grande diversão pública, popular. Como, por exemplo, os quadrinhos, as telenovelas, os reality shows, revistas de fofoca, a música não tradicional ou clássica – isso é, a música popular, que chega ao grande público. Os tradicionais valores da cultura estão cada vez mais minoritários e quase, quase clandestinos.
Este é um fenômeno que me parece muito perigoso para a sociedade do futuro, porque eu creio que a cultura não é entretenimento. É, também, entretenimento, mas é algo muito mais importante que isso. É um tipo de conhecimento, de preocupação que responde a certas perguntas que não podem encontrar resposta em outros campos. Essa é a síntese do livro.
O senhor acredita que seja um fenômeno planetário, algo que está acontecendo pela primeira vez na história?
Sim. Creio que é a primeira vez nessa dimensão. Sempre houve em todas as sociedades atividades de diversão e entretenimento. E é muito bom que haja essas atividades. Mas não se associavam, não se identificavam inteiramente com a cultura e, sobretudo, não a repensavam, não a substituíam. E esse é o fenômeno que eu creio que ocorre em nossos dias e sobre o que se refere meu ensaio.
O senhor diz que, no campo das artes visuais, especialmente depois de Marcel Duchamp e Andy Warhol, não há mais distinção entre o que é canônico e highbrow e o que não é. Tudo tem valor estético, dependendo de gosto. Por que isso representa um problema?
Porque depende do que você entende por arte. Se você acredita que a arte é uma diversão, não há nenhum problema. Você pode buscar coisas que são originais e banais, coisas que são sérias e que não são sérias. Mas se você acha que a arte tem a função muito mais importante que a de entreter e divertir, que é a de preocupar, de te abrir janelas para determinados problemas existenciais, políticos, culturais, filosóficos; então a confusão de valores, de não saber distinguir o que é belo, o que é feio, o que é autêntico, o que é postiço e artificial, sim, é bastante grave.
Essa é uma conclusão relacionada à cultura, à vida das pessoas, aos valores que regulam a conduta das pessoas. E num campo sobretudo isso é muito perigoso, que é o campo da vida pública, a vida cívica. O espírito crítico desaparece, se deprava, degenera. A liberdade e a democracia sofrem uma ameaça muito considerável. Isso para mim é consequência de confundir arte com lixo, a arte autêntica com a arte dos trapaceiros, dos palhaços.
Devem existir trapaceiros e devem existir palhaços para a diversão, mas se isso passa a substituir inteiramente a arte, então creio que há consequências que têm um efeito tremendamente negativo, sobretudo na vida cívica da sociedade.
Acredita, por exemplo, que a obra de John Cage, mencionado em seu livro, não tem valor artístico?
John Cage é um agitador. Ele tem essa vocação rupturística, de romper com a tradição, inovar. A atitude é simpática, mas o resultado foi fazer uma confusão maior. John Cage não é um criador. É um agitador, um demolidor. É uma espécie de figura muito interessante que existe em todo âmbito cultural. Alguém que questiona o existente, que quer substituir o existente com algo novo. Mas acho que, como no caso de Duchamp, John Cage destruiu muito e não construiu nada. O que deixou foi uma grande confusão de restos e de grosserias que não foram fertilizados. O que geraram foi uma espécie de desculpa para a indisciplina e também para a enganação. Essa é a minha crítica a John Cage.
É a mesma a Duchamp, que era uma pessoa genial, mas criou uma grande confusão. Restos e grosserias se justificam se provocam consequências que se podem chamar de criativas, produtivas. Mas não existem valores. Tudo vale no campo da arte? Mentira. Não vale tudo. Não é verdade. Há coisas que são originais e coisas que não são. Coisas profundas e coisas superficiais. E esse tipo de valores são os que determinavam a cultura. Hoje em dia, em nossa trivialidade cultural, é quase impossível fazer esse tipo de valoração e discriminação.
Na sua opinião, há um modo de voltar a ter essa distinção, ou, ainda,  acredita que a sociedade irá eventualmente recriar estes parâmetros?
Acredito. Mas não regressando ao passado, e sim olhando outra vez a cultura de acordo com a problemática da nossa época, com um conteúdo profundo, rico e criativo. E acho que o caminho é a educação. Mas a educação no sentido mais amplo da palavra, não somente nos colégios e nas universidades, mas nas famílias e nos meios de comunicação – o que é muito difícil quando a informação passou a ser também uma forma de diversão, que passou a ser o objetivo primordial das pessoas.
Sendo assim, muito dificilmente os meios de comunicação podem contribuir para resgatar a necessidade de certos valores mais ou menos estáveis e permanentes. Esse fenômeno, todavia, é um processo. E é preciso haver autênticos criadores, pensadores e escritores. Mas o que quero assinalar é que a confusão cresce mais rapidamente que a defesa da autenticidade. E é um fenômeno pela primeira vez planetário. Vê-se nos países desenvolvidos, subdesenvolvidos, no Ocidente, na Ásia, na África. É uma globalização irreversível.
A internet é outro exemplo onde não há distinção entre alta e baixa cultura. Contudo, seu surgimento democratizou o acesso à cultura mais do que qualquer outro fato, dando aos indivíduos uma autonomia e liberdade de que não desfrutavam antes. O que pensa disso?
A internet democratizou a informação, mas não a cultura. Foi uma grande revolução, muito positiva, do nosso tempo. Mas essa informação, se não há uma cultura que discrimine, pode também naturalizar completamente a informação, porque o excesso de informação pode ser um excesso de confusão. Por isso a cultura é muito importante, pois permite distinguir o que é relevante do que não é relevante.
O senhor utiliza a internet?
Sim… quando não tenho mais remédio.
Embora best-sellers como o recente 50 tons de cinza não possuam valor entre críticos, intelectuais e a academia, não podemos ignorar o fato de que cativam leitores que possivelmente não estariam lendo nada. O senhor reconhece o valor da dita baixa cultura, ou a rejeita completamente?
Sempre houve literatura popular, para entretenimento. E é bom que haja. O que é terrível é quando isso passa a substituir o que era tradicionalmente a verdadeira literatura. E essa é uma característica contemporânea. E por isso os leitores leem o quê? Não leem Proust. Não leem Kafka. Não leem Joyce. Não leem Guimarães Rosa (sou um grande admirador de Guimarães Rosa). Mas se aquilo de que você gosta são os best-sellers, já não pode ler Guimarães Rosa porque está sem condições de fazer o esforço intelectual para poder ler Grande sertão: Veredas. Impossível.


terça-feira, 16 de abril de 2013

A Educação de um Garoto

Extraído de BRAVO! Online

O sul-africano J. M. Coetzee lança A Infância de Jesus. O romance narra o crescimento de David em meio a dificuldades com o sistema de ensino. BRAVO! disponibiliza a seguir um capítulo do livro


Ao voltar para o quarto essa noite, ele encontra um recado debaixo da porta. É de Ana:O senhor e David gostariam de ir a um piquenique para recém-chegados? Me encontrem amanhã ao meio-dia no parque, perto da fonte. A.
Ao meio-dia, estão na fonte. Já está quente — até os pássaros parecem letárgicos. Longe do barulho do tráfego, se instalam debaixo de uma árvore frondosa. Ana chega pouco depois, com uma cesta. “Desculpe”, diz, “tive de resolver uma coisa.”
“Quantas pessoas vêm?”, ele pergunta.
“Não sei. Talvez meia dúzia. Vamos esperar para ver.”
Eles esperam. Não vem ninguém. “Parece que somos só nós”, Ana diz afinal. “Vamos começar?”
A cesta contém apenas um pacote de bolachas, um pote de pasta de feijão sem sal e uma garrafa de água.
Mas o menino devora sua parte sem reclamar.
Ana boceja, se estende na grama, fecha os olhos.
“O que você quis dizer outro dia quando usou as palavrastirar tudo da cabeça?”, ele pergunta. “Você disse que David e eu temos de tirar da cabeça as ligações antigas.”
Preguiçosa, Ana sacode a cabeça. “Outra hora”, diz. “Agora não.”
No tom dela, em seu olhar velado, ele sente um convite. A meia dúzia de participantes que não apareceu — seria uma invenção? Se o menino não estivesse ali ele deitaria ao lado dela no gramado e talvez deixasse sua mão pousar bem de leve na mão dela.
“Não”, ela murmura, como se lesse seus pensamentos. Um fantasma de ruga passa por sua testa. “Isso não.”
Isso não. Como entender essa moça, ora quente, ora fria? Será que tem alguma coisa na etiqueta dos sexos ou das gerações nesta terra nova que ele não está entendendo?
O menino o cutuca, aponta o pacote de bolachas quase vazio. Ele passa um pouco de pasta numa bolacha e dá a ele.
“Ele tem bastante apetite”, diz a moça, sem abrir os olhos.
“Está o tempo todo com fome.”
“Não se preocupe. Ele se adapta. Criança se adapta depressa.”
“Se adapta a passar fome? Por que ele haveria de se adaptar à fome se não existe nenhuma falta de comida?”
“Se adapta a uma dieta moderada, eu quis dizer. A fome é como um cachorro dentro do estômago: quanto mais comida se dá, mais ele exige.” Ela se senta de repente, se dirige ao menino. “Ouvi dizer que você está procurando sua mãe”, ela diz. “Está com saudade da mamãe?”
O menino faz que sim.
“E como é o nome da sua mãe?”
O menino olha interrogativamente para ele.
“Ele não sabe o nome dela”, ele diz. “Tinha uma carta quando tomou o navio, mas perdeu.”
“O barbante arrebentou”, o menino diz.
“A carta estava numa bolsinha”, ele explica, “pendurada no pescoço dele com um barbante. O barbante arrebentou e a carta se perdeu. Procuraram no navio inteiro. Foi assim que eu conheci
o David. Mas a carta, não encontraram.”
“Caiu no mar”, diz o menino. “Os peixes comeram.”
Ana franze a testa. “Se você não lembra o nome da sua mamãe, pode me contar como ela era? Consegue desenhar um retrato dela?”
O menino sacode a cabeça.
“Então, a mamãe se perdeu e você não sabe onde procurar.”
Ana faz uma pausa para refletir. “Então, que tal se o seupadriñocomeçar a procurar outra mamãe para você, para te
amar e cuidar de você?”
“O que que épadriño?”, o menino pergunta.
“Você fica me encaixando em papéis”, ele interrompe. “Não sou pai do David, nempadriño. Simplesmente estou ajudando o menino a encontrar a mãe.”
Ela ignora o protesto. “Se arrumar uma esposa”, diz ela, “pode servir de mãe para ele.”
Ele cai na gargalhada. “Que mulher vai querer casar com um homem como eu, um estranho que não tem nem uma muda de roupa?” Ele espera que a moça discorde, mas ela não fala nada. “Além disso, mesmo que eu arrumasse de fato uma esposa, quem garante que ela ia querer — sabe — um filho adotivo? Ou que o nosso amiguinho aqui ia aceitar outra mãe?”
“Nunca se sabe. Crianças se adaptam.”
“Como você sempre diz.” Ele sente a raiva crescer por dentro. O que essa moça tão assertiva sabe de crianças? E que direito tem de lhe passar sermão? Então, de repente, as peças do quebra-cabeças todas se encaixam. As roupas de mau gosto, a severidade desconcertante, a história de padrinho — “Você por acaso é freira, Ana?”, ele pergunta.
Ela sorri. “Por que está perguntando?”
“Você é uma daquelas freiras que largou o convento para viver no mundo? Para trabalhar com coisas que ninguém mais quer fazer: em prisões, orfanatos, asilos? Em centros de recepção de refugiados?”
“Que ridículo. Claro que não. O Centro não é uma prisão. Não é uma entidade filantrópica. Faz parte daAsistencia Social.
“Mesmo assim, como aguentar uma onda sem fim de gente como nós, desamparada, ignorante, carente, se não tiver fé em alguma coisa para ganhar forças?”
“Fé? Não tem nada a ver com fé. Fé quer dizer acreditar no que você faz mesmo que não dê frutos visíveis. O Centro não é assim. As pessoas chegam precisando de ajuda e nós ajudamos. Ajudamos e a vida delas melhora. Não tem nada de invisível. Nada que exija fé cega. Nós fazemos o nosso trabalho e tudo acaba dando certo. É só isso.”
“Nada de invisível?”
“Nada de invisível. Duas semanas atrás o senhor estava em Belstar. Na semana passada, encontrou trabalho nas docas. Hoje está fazendo piquenique no parque. O que tem de invisível nisso tudo? É progresso, progresso visível. E só para responder a sua pergunta, não, eu não sou freira.”
“Então por que prega esse ascetismo? Diz que temos de dominar a fome, de deixar o cachorro interno a pão e água. Por quê? Qual o problema com a fome? Para que servem os apetites da gente senão para mostrar o que precisamos? Se a gente não tivesse apetites, desejos, como ia viver?”
Parece-lhe uma boa questão, uma questão séria, que poderia perturbar até a freira mais estudada.
A resposta dela vem bem fácil, tão fácil e em voz tão baixa, como se fosse para o menino não ouvir, que por um momento ele se equivoca: “E no seu caso, para onde seus desejos levam o senhor?”.
“Meus desejos? Posso ser franco?”
“Pode.”
“Sem querer desrespeitar você nem sua hospitalidade, me levam a mais que bolacha e pasta de feijão. Me levam, por exemplo, a carne com purê de batata e molho. E tenho certeza que este rapazinho aqui” — ele estende a mão e pega o braço do menino — “sente a mesma coisa. Não sente?”
O menino balança vigorosamente a cabeça.
“Carne pingando molho”, ele continua. “Sabe o que mais me surpreende neste país?” Um tom ousado está se infiltrando em sua fala; seria mais sensato parar, mas ele não para. “Que seja tão manso. Todo mundo que eu encontro é tão bom, tão gentil, tão bem-intencionado. Ninguém xinga, ninguém fica bravo. Ninguém fica bêbado. Ninguém nem levanta a voz. Vivem num regime de pão, água e pasta de feijão e dizem que estão satisfeitos. Como pode ser, humanamente falando? Vocês estão mentindo, até para si mesmos?”
A moça abraça os joelhos, olha para ele sem dizer nada, esperando que ele termine a tirada.
“Nós estamos com fome, esse menino e eu.” Com força, ele puxa o menino para si. “Estamos com fome o tempo todo. Você me diz que nossa fome é uma coisa de outro mundo que trouxemos conosco, que não tem lugar para ela aqui, que temos que dominar a fome. Quando acabarmos com nossa fome, teremos provado que somos capazes de nos adaptar, e poderemos ser felizes para sempre. Mas eu não quero matar de fome o cachorro aqui dentro! Quero dar comida para ele! Você não acha?” Sacode o menino. O menino se enfia debaixo de sua axila, sorrindo, fazendo que sim com a cabeça. “Não acha, menino?”
Cai um silêncio.
“O senhor está mesmo com raiva”, diz Ana.
“Não estou com raiva. Estou com fome! Me diga: o que tem de errado em satisfazer um apetite comum? Por que nossos impulsos, fomes e desejos normais precisam ser eliminados?”
“Tem certeza que quer continuar falando disso na frente do menino?”
“Não tenho vergonha do que estou dizendo. Não é nada que se deva esconder de uma criança. Se uma criança pode dormir ao relento, em cima do chão duro, então também pode escutar uma discussão séria entre adultos.”
“Muito bem, então eu vou em frente com a discussão séria. O que o senhor quer de mim é uma coisa que eu não faço.”
Ele olha, perplexo. “O que eu quero de você?”
“É. O senhor quer que eu deixe o senhor me abraçar. Nós dois sabemos o que isso quer dizer:abraçar. E eu não permito isso.”
“Não falei nada de te abraçar. E o que tem de errado em abraçar, afinal, se você não é freira?”
“Recusar desejos não tem nada a ver com ser ou não ser freira. Eu simplesmente não faço isso. Não permito. Não gosto. Não tenho apetite para isso. Não tenho apetite para a coisa em si e não desejo ver o que isso faz com os seres humanos. O que faz com um homem.”
“O que quer dizer isso:o que faz com um homem?”
Ela olha intensamente para o menino. “Tem certeza que quer continuar?”
“Continue. Nunca é cedo para aprender sobre a vida.”
“Tudo bem. O senhor me acha atraente, eu sei disso. Talvez até me ache bonita. E porque me acha bonita, seu apetite, seu impulso, é me abraçar. Estou lendo direito os sinais? Os sinais que o senhor está me dando? Porque se não me achasse bonita, não teria esse impulso.”
Ele fica em silêncio.
“Quanto mais bonita acha que eu sou, mais urgente fica seu apetite. É assim que funcionam esses apetites que o senhor toma por estrelas guias e segue cegamente. Agora pense um pouco. Por favor, me diga, o que a beleza tem a ver com o abraço ao qual o senhor quer me submeter? Qual a relação entre uma coisa e outra? Explique.”
Ele fica quieto, mais que quieto. Fica pasmo.
“Vamos lá. O senhor falou que não se importava que o seu afilhado ouvisse. Falou que queria que ele aprendesse sobre a vida.”
“Entre um homem e uma mulher”, ele diz, afinal, “às vezes surge uma atração natural, imprevista, não premeditada.
Um acha o outro atraente, ou mesmo, para usar a outra palavra, bonito. A mulher mais bonita que o homem, geralmente. Porque uma coisa vem depois da outra, a atração e o desejo de abraçar vêm da beleza, é um mistério que eu não sei explicar a não ser para dizer que ser atraído por uma mulher é o único tributo que eu, que o meu ser físico, sabe prestar à beleza de uma mulher. Chamo de tributo porque sinto que é uma oferenda, não um insulto.”
Ele faz uma pausa. “Continue”, ela diz.
“É só isso que eu queria dizer.”
“É isso. E como um tributo a mim — uma oferenda, não um insulto —, o senhor quer me abraçar apertado e enfiar uma parte do seu corpo dentro de mim. Como um tributo, o senhor diz. Estou perplexa. A coisa toda me parece um absurdo — absurdo o senhor querer fazer isso, absurdo se eu permitir.”
“Só quando você fala desse jeito é que parece absurdo. Em si, não tem nada de absurdo. Não pode ser absurdo, uma vez que é um desejo natural do corpo natural. É a natureza falando em nós. É o jeito como as coisas são. O jeito como as coisas são não pode ser absurdo.”
“É mesmo? E se eu disser que me parece não só absurdo, mas feio também?”
Ele sacode a cabeça sem poder acreditar. “Não pode estar falando sério. Eu posso parecer velho e feio — eu e meus desejos. Mas com certeza você não pode acreditar que a natureza em si seja feia.”
“Posso, sim. A natureza pode fazer parte da beleza, mas a natureza pode fazer parte da feiura também. As partes do corpo que o senhor discretamente não menciona, não na frente do seu afilhado: acha que são bonitas?”
“Em si mesmas? Não, em si elas não são bonitas. O todo é que é bonito, não as partes.”
“E essas partes que não são bonitas — o senhor quer pôr dentro de mim! O que eu devo pensar?”
“Não sei. Me diga o que pensa.”
“Que toda essa conversa bonita de prestar tributo à beleza éuna tontería. Se o senhor achasse que eu sou uma encarnação do bem, não ia querer praticar essas coisas comigo. E então por que quer fazer isso se eu sou uma encarnação da beleza? A beleza é inferior ao bem? Explique.”
Una tontería: o que é?”
“Bobagem. Absurdo.”
Ele se põe de pé. “Eu não vou mais ficar me desculpando, Ana. Acho que essa discussão não vai levar a nada. Acho que não sabe do que está falando.”
“É mesmo? Acha que eu sou uma criança ignorante?”
“Pode não ser uma criança, mas acho, sim, que é ignorante das coisas da vida. Venha”, ele diz ao menino, e pega sua mão. “Já fizemos nosso piquenique, agora está na hora de agradecer à moça e procurar alguma coisa para a gente comer.”
Ana se reclina na grama, estica as pernas, cruza as mãos no colo, sorri para ele, zombeteira. “Cutucou a ferida, foi?”,ela pergunta.
Debaixo do sol escaldante, ele atravessa o parque vazio, o menino trotando para acompanhar seu ritmo.
“O que épadriño?”, o menino pergunta.
Padriñoé uma pessoa que fica no lugar do seu pai quando, por alguma razão, seu pai não está.”
“Você é meupadriño?”
“Não, não sou. Ninguém me convidou para ser seu padrinho. Sou só seu amigo.”
“Eu posso convidar você para ser meupadriño.”
“Isso não é você que faz, meu menino. Não pode escolher um padrinho para você mesmo, do mesmo jeito que não pode escolher seu pai. Não tem uma palavra certa para o que eu sou para você, assim como não tem uma palavra certa para o que você é para mim. Mas se você quiser, pode me chamar de Tio. Quando perguntarem:Quem ele é para você?, você pode responder:Ele é meu tio. Ele é meu tio e gosta de mim. E eu vou dizer:Ele é o meu menino.
“Mas aquela moça vai ser minha mãe?”
“Ana? Não. Ela não está interessada em ser mãe.”
“Você vai casar com ela?”
“Claro que não. Não estou aqui procurando esposa, estou aqui para ajudar você a encontrar sua mãe, sua mãe de verdade.”
Ele está tentando manter a voz controlada, o tom leve; mas a verdade é que o ataque da moça o abalou.
“Você ficou bravo com ela”, diz o menino. “Por que ficou bravo?”
Ele para de andar, ergue o menino e lhe dá um beijo na testa. “Desculpe eu ter ficado bravo. Não estava bravo com você.”
“Mas ficou bravo com a moça e ela ficou brava com você.”
“Fiquei bravo com ela porque ela nos trata mal e eu não entendo por quê. Nós discutimos, ela e eu, discutimos a sério. Mas agora já passou. Não foi importante.”
“Ela disse que você queria enfiar uma coisa dentro dela.”
Ele se cala.
“O que que é isso? Você quer mesmo enfiar uma coisa dentro dela?”
“Era só um modo de dizer. Ela estava querendo dizer que eu estava tentando impor as minhas ideias para ela. E tinha razão. A gente não deve impor ideias para os outros.”
“Eu imponho ideias para você?”
“Não, claro que não. Vamos procurar alguma coisa para comer.”
Eles vasculham as ruas a leste do parque, em busca de algum tipo de restaurante. É um bairro de casas modestas, com
um prédio de apartamentos de vez em quando. Encontram apenas uma loja. naranjas, diz a placa, em letras grandes. As portas metálicas estão fechadas de forma que ele não consegue ver se vendem laranjas de fato ou seNaranjasé apenas um nome.
Ele se dirige a um homem que passa com um cachorro na guia. “Com licença”, diz, “meu menino e eu estamos procurando um café ou um restaurante para comer, ou, se não isso, uma loja de mantimentos.”
“Domingo de tarde?”, o homem pergunta. O cachorro fareja os sapatos do menino, depois seus fundilhos. “Não sei o que sugerir, a menos que esteja disposto a ir até a cidade.”
“Tem algum ônibus?”
“O número 42, mas não funciona domingo.”
“Então, não podemos de fato ir até a cidade. E não tem nada por perto onde a gente possa comer. E todas as lojas estãofechadas. O que o senhor sugere que a gente faça?”
Os traços do homem endurecem. Ele puxa a guia do cachorro. “Vamos, Bruno”, diz.
Mal-humorado, ele volta ao Centro. Avançam devagar, uma vez que o menino fica hesitando e pulando para evitar asrachaduras do calçamento.
“Vamos mais depressa”, ele diz, irritado. “Deixe para brincar outro dia.”
“Não. Não quero cair dentro de uma rachadura.”
“Que bobagem. Como um menino grande como você pode cair dentro de uma rachadura pequena dessas?”
“Não essa rachadura. Outra rachadura.”
“Qual rachadura? Mostre qual.”
“Não sei! Não sei qual rachadura. Ninguém sabe.”
“Ninguém sabe porque ninguém pode cair dentro de uma rachadura do calçamento. Agora vamos depressa.”
“Eu posso! Você pode! Qualquer um pode! Você que não sabe!”

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Legião Urbana é Presenteada com Mais um Longa


Depois de “O Homem do Futuro” e “Somos Tão Jovens”, a banda de rock brasileiro que fez história e revolucionou nos anos 80 é presenteada com mais um filme, dessa vez, uma adaptação da música “Faroeste Caboclo”, canção esta que nomeou o longa. Previsto para estrear nas telinhas em 31 de maio de 2013, o trabalho que tem como diretor René Sampaio, conta com um elenco recheado de bons atores, como Ísis Valverde, Alex Sander, Fabrício Boliveira, Felipe Abib e Rodrigo Dorta. Da mesma forma que se desenrola a canção da legião, o drama vai contando a vida de João de Santo Cristo, desde a sua infância no interior da Bahia até a sua ida para Brasília no início dos anos 80, onde se envolve com o tráfico de drogas. Durante esse período, conhece o seu grande amor Maria Lúcia, apesar de decidir mudar de vida por essa paixão, se vê muito envolvido no tráfico e sem saída. Há de se ressaltar que os nove minutos que Faroeste Caboclo deposita no álbum de 87 “Que País é Este” é fielmente retratado no filme, obviamente que o longa-metragem incrementou outras faces, mas a essência foi mantida. Agora é esperar mais esse filme que homenageia uma das bandas que foi de mais destaques no rock nacional.


Trailer:


terça-feira, 9 de abril de 2013

Tudo de Tom

Extraído de Revista Cult:


O objetivo do Instituto Antônio Carlos Jobim, criado em maio de 2001, é preservar e disponibilizar para o público toda a obra de seu homenageado: intelectual, poética e, especialmente, musical.
Quase uma década depois de sua fundação, o Instituto disponibiliza um acervo digital que pode ser acessado através de buscas categorizadas ou de maneira interativa. A linha cronológica dos arquivos começa com um retrato do pai de Tom, Jorge de Oliveira Jobim, em 1910, e termina com áudios dos três volumes de Raros Compassos, sua última compilação nacional. Lançada em 2000, traz gravações do fim dos anos 1950 e versões pouco conhecidas de grandes sucessos, como Chega de Saudade e Eu sei que vou te amar.
O Instituto possui sede no Jardim Botânico, um dos lugares preferidos do músico, que foi um ávido defensor da natureza brasileira. A Casa do Acervo, que guarda os originais físicos, possui também uma exposição permanente de documentos, fotografias, livros e outros objetos pessoais.
Instituto Antônio Carlos Jobim
Onde: Rua Jardim Botânico, 1008, Rio de Janeiro (RJ)



segunda-feira, 8 de abril de 2013

Tiago Iork


Tiago Iork é cantor e compositor brasileiro, invadindo outros mundos com apenas 10 (dez) anos de idade, quando se mudou para a Inglaterra e lá permaneceu por mais 5 (cinco) anos. A primeira vez que foi realmente notado no cenário musical foi quando se apresentou cantando a música “Scared”, no festival de música da PUC-PR, no período que estudava publicidade. Em 2009 ganhou ainda mais notoriedade quando regravou “My Girl” e a mesma teve espaço em um novela de Manoel Carlos “A Vida da Gente”, sem falar as diversas músicas que estiverem presentes em Malhação. Tiago se apresenta para o mundo com uma voz suave, quase como uma mão macia a nos alisar o rosto, um olhar melancólico de vago, composições e interpretações de doer a alma que até nos faz lembrar do folk. Escutar Iork não é apenas ligar o som e ter uma melodia qualquer, mas sim encarar uma realidade ímpar, uma tristeza infinda, um coração apaixonado despedaçado em mil, e entre olhares e mais olhares nós podemos desvendar o mundo. Para quem ainda não conhece o trabalho do cantor, vale a pena conferir.

Tiago Iork em Tempo Perdido





quinta-feira, 4 de abril de 2013

Nando Reis - Entrevista


Revista Cult entrevista Nando Reis:

Como foi o processo de produção de Sei?
Gosto de gravar fora de São Paulo, porque para mim gravar um disco é um processo de imersão. É um tempo em que eu gosto de me afastar fisicamente da minha casa e das minhas atividades mais prosaicas e ordinárias, como filhos e telefonemas. É como se fosse uma viagem intergaláctica.
O Jack Endino, produtor com quem eu já trabalhei em discos dos Titãs e no meu segundo disco solo, mora em Seattle. E eu queria ter essa experiência de levar a banda pra lá, gravar no estúdio dele, de me descontextualizar para poder me recontextualizar.
Existe alguma mensagem que você quer passar com o disco?
Não trato a música com esse conceito de mensagem. A forma como as pessoas se relacionam com a música depende ou estabelece uma relação de liberdade, de interpretação.  Não há nenhum código que eu queria fixar na cabeça das pessoas. Simplesmente faço as músicas de acordo com aquilo que sinto, na forma como gosto de escrever, sobre os assuntos que gosto. Depois disso, as pessoas fazem com ela o que bem entender.
Quais foram as dificuldades em gravar um disco independente?
As facilidades que eu tinha de ter uma gravadora cuidando da parte financeira, pagando estúdio e aluguel, foram substituídas por outras. Não acho que seja muito diferente. Gravar um disco é sempre uma coisa doida e prazerosa. O que teve de mais novo foi a venda pela internet.
Estamos chegando a dez mil cópias, que é um número bastante significativo para mim porque são dez mil unidades que estão na casa, ou sei lá onde, de dez mil pessoas que querem realmente comprar. É muito mais do que o número em si, mas o fato de ter gente que se interessa e que se dispõe a estar junto comigo desta nova forma. Estou muito feliz.
Fora que é um barato ver as possibilidades de continuar a vender discos, porque é o que eu faço. Me preocupa o fato de não ter discos sendo vendidos. Eu não me refiro apenas ao disco físico, porque parece uma coisa nostálgica, mas a aquela ideia que a música tem quando colocada em um disco. A ordem das músicas, a capa. É muito mais do que simplesmente baixar a musica de que você gosta.
É por esse motivo que você não disponibiliza o download das músicas no seu site?
Eu acho que as pessoas podem baixar a música e fazer o que elas quiserem, mas que elas deem seus pulos. Defendo a ideia de que o disco é mais interessante. O que eu faço é isso, o que eu tenho para oferecer é isso. Quem quiser simplesmente uma musica, se vira.
Qual das quinze faixas é a sua preferida?
É sempre difícil dizer isso porque eu me sinto traindo as outras. É como se você me perguntasse de qual dos meus cinco filhos eu gosto mais. Mas tem uma faixa que eu amo que é a “Pré-sal”, que abre o disco. Ela é uma faixa longa, de sete minutos, em que o assunto é, aparentemente, hermético e cheio de códigos.
O título foi dado pela minha irmã, e é como se falasse aquilo que é a pré-consciência, são fatos da minha própria infância. E a música tem um tipo de furor que eu acho adequado  para musicas de abertura. Sou louco pelas musicas que abrem os discos. Acho que das musicas de abertura que já fiz, ela é a que mais me agrada.
Por que o nome Sei?
É o nome de uma música que eu adoro, ao mesmo tempo em que tem uma ideia de que é uma afirmação e é muito menos do que isso. É aquele “sei” que você diz quando está conversando com outra pessoa e acaba sendo impactado por uma quantidade de novidades, informação. Eu gosto desse nome.
Como você avalia a produção independente brasileira?
Não é porque eu gravei um disco independente que eu mudei de time. Até porque as gravadoras nunca foram minhas adversárias. Todos os discos que eu fiz com elas são muito importantes. Não é uma disputa. O que eu gosto na independência é a liberdade.
No meu caso, por exemplo, foi a liberdade conquistada de vender o meu disco. Porque eu gravei discos que não estão nem em catálogo, não são fabricados e não estão nem em lojas – na verdade, quase não há lojas para isso. Não posso ficar satisfeito enquanto há uma crise. As indústrias dizem que as pessoas não compram discos e eu pergunto, como vão comprar se os discos não são fabricados?


quarta-feira, 3 de abril de 2013

Horrível e Sagrado

Retirado de BRAVO! Online


Admirado por pensadores como Roland Barthes e Michel Foucault, o escritor francês Georges Bataille (1897-1962) notabilizou-se por uma obra libertária, influenciada pela psicanálise, pela antropologia e pelo surrealismo. Em O Erotismo, ele propõe uma definição para o termo que o associa à transgressão de regras e à religião, transformando o ensaio num clássico. Em 1957, ano da publicação do livro, Bataille escreveu uma carta a Roger Caillois, sociólogo e crítico literário, submetendo-lhe o projeto de uma revista sobre o mesmo tema, Genèse, que não saiu do papel. Na missiva, o escritor incorporou um texto que sintetiza o ensaio. Inédito por aqui e apresentado a seguir, A Significação do Erotismo integra a nova edição brasileira do livro, que será lançada em abril pela Autêntica.
“O tempo presente viu ocorrerem importantes mudanças nas condições da vida sexual.
Convém dar a essas mudanças o nome de revolução sexual. Elas acontecem por etapas, há várias gerações. Ligadas ao conjunto de nossas transformações sociais, foram, em particular, a consequência do abalo que se seguiu à Primeira Guerra Mundial.
Nossa revolução sexual tem múltiplas significações. Houve inicialmente o movimento de oposição às regras estreitas que paralisavam as relações dos sexos entre si. Ao mesmo tempo, a revisão de uma moral fundada sobre a noção de pecado sexual e de vergonha. O homem moderno teve que responder, por outro lado, à necessidade de esclarecer aquilo que permanecia nele de sombrio e fugidio. A humanidade devia enfim conhecer a si mesma inteiramente, devia dominar seus poderes e reencontrar sua unidade.
Essas mudanças foram ajudadas e aceleradas pelas descobertas da psicologia moderna e da psicanálise; o progresso dos conhecimentos em matéria de sexualidade as assegurou e aumentou seu alcance. Não apenas nossos costumes, como também a consciência aprofundada que temos de nós mesmos, nos opõem de maneira contundente à humanidade anterior a essa revolução sexual. Não é que a humanidade volte à ingenuidade dos povos selvagens, mas, saindo de um mundo onde seus impulsos mais fortes eram cegamente reprimidos, abre-se diante dela a possibilidade de uma lucidez sem igual. Ela se beneficia de uma liberdade real, mas tem a memória de um passado recente: situa essa liberdade em relação a uma servidão cuja experiência ainda traz inscrita em si.
As descobertas de Freud, começadas no fim do século passado, tiveram uma importância decisiva. Elas modificaram estranhamente a imagem que o homem fazia de si mesmo. A psicanálise substitui o idealismo tradicional por uma representação mais modesta. Segundo ela, o impulso sexual começa com a vida. E as desordens que, desde a tenra infância, esse impulso nos impõe têm consequências na idade adulta. Do berço ao leito de morte, a sexualidade está na base de uma agitação que a ingenuidade do pensamento comum, imbuído de idealismo, desconhece. A sexualidade não é, como foi apressadamente deduzido, o fundamento da vida humana: foi sem dúvida o trabalho que, desde a origem, diferenciou o homem do animal. Mas as mentiras do idealismo foram possíveis na medida em que uma humanidade cega negou os impulsos sexuais que, todavia, não haviam cessado de agitá-la profundamente. Os trabalhos de Freud permitiram saber que os impulsos sexuais se traduzem também em nossas aspirações elevadas: eles se exprimem, em particular, na religião e, finalmente, na arte e na literatura. Estamos assim, graças à psicanálise, nos antípodas da antiga maneira de ver, para a qual a sexualidade era a tara congênita de uma criatura que aspira à perfeição.
Se os resultados da psicanálise estão na base do conhecimento moderno da sexualidade, existe a possibilidade hoje de, sem negligenciá-los, ir ainda mais longe. Podemos reencontrar a significação do erotismo no plano em que se colocava outrora a religião. Talvez cheguemos assim a uma das descobertas mais importantes de nosso tempo. Pelo menos é indo nessa direção que podemos ter acesso às últimas consequências de nossa revolução sexual.
Eis o que hoje podemos postular:
EM SUA VERDADE FUNDAMENTAL, O EROTISMO É SAGRADO, O EROTISMO É DIVINO.
Reciprocamente, o sagrado, o divino, se podem se afastar do erotismo, têm em sua base a violência e a intensidade deste, participam, em seu fundamento, do mesmo impulso.
A humanidade profunda só se revela a nós se reconhecemos a unidade do sentimento divino – do estremecimento sagrado – e do erotismo liberado da imagem grosseira imposta pela pudicícia tradicional. (...)
Isso não deve nos impedir de ver, em contrapartida, os aspectos alarmantes do erotismo; geralmente, o divino, o sagrado também são acompanhados de horror. Em todo caso, emana do erotismo algo de trágico, que não podemos negar e que devemos considerar antes de tudo em nossa meditação profunda.
O marquês de Sade exprimiu esse lado da realidade sexual. Quaisquer que sejam os aspectos insustentáveis de sua obra, ele compreendeu que o erotismo – e o horror implicado no fundo do desejo erótico – colocava em questão o homem inteiro. Devemos reconhecer desde o princípio que, falando do erotismo, levantamos a questão mais pesada.
Quero lembrar aqui esta frase de Maurice Blanchot [escritor francês] a respeito do pensamento de Sade:
Não estamos dizendo que esse pensamento seja viável. Mas ele nos mostra que entre o homem normal, que encerra o homem sádico num impasse, e o sádico, que faz desse impasse uma saída, é este que conhece melhor a lógica de sua situação e que tem dela o entendimento mais profundo, a ponto de poder ajudar o homem normal a se compreender a si mesmo, ajudando-o a modificar as condições de toda compreensão.
A meu ver, essa frase exprime a dificuldade essencial que devemos perceber quando abordamos o domínio sagrado do erotismo.
O erotismo abre um abismo. Querer iluminar suas profundezas exige ao mesmo tempo uma grande resolução e uma calma lucidez, a consciência de tudo aquilo que uma intenção tão contrária ao sono geral coloca em jogo: é certamente o mais horrível, e é também o mais sagrado.”
O livroO Erotismo, de Georges Bataille. Tradução de Fernando Scheibe. Editora Autêntica. Preço a definir. Lançamento previsto para abril.