É desse modo que o Iraque consolida o
retrocesso em seu país. Uma garota aos nove anos de idade ainda tem o seu corpo
em formação, a sua personalidade a ser definida, está descobrindo agora o
prazer de se divertir com as suas bonecas, de poder errar sem medo de ser
punida, porque é neste momento que está aprendendo e descobrindo como é viver
com os seus tropeços. Imaginar uma criança ser submetida, por meio da imposição
de uma lei do seu país, a casar com essa idade e o pior, estar obrigada a
saciar sexualmente o seu marido, visto que é um dever da mulher em matrimônio,
é quase inacreditável, acompanhado com os sentimentos de lamento e de revolta.
Essa proposta de lei, obviamente é de
iniciativa dos mais fundamentalistas, os xiitas, e o intuito é de abranger
somente essa parcela da população (que corresponde atualmente a 60% no Iraque),
denominado Lei Jaffari (em homenagem ao santo do islã xiita – Jaffari Al
Sadiq), tendo como intuito a implementação
de um novo código de família que entra em choque diretamente com a atual
Lei do Status Pessoal, considerada uma das que mais beneficiam as mulheres em
países árabes.
Uma das justificativas para colocar em
prática os novos parâmetros que a lei estabelece é que por ser um país islâmico,
a sua religião ultrapassa os ditames da lei civil, deste modo, devendo seguir o
sharia (lei islâmica). Além disso,
podemos ver claramente que o Projeto vem com teor e embate político, quando
Jamila Ali Kirani, do partido xiita declara que “passamos muito tempo sob lei
sunita, queremos uma lei para nós”. Esclarecendo: Os sunitas e xiitas se
apresentam como uma das mais significativas divisões do mundo islâmico, tendo
divergências e grandes rivalidades históricas.
Dentre os dispositivos da proposta
de lei estão: a redução da idade mínima de casamento para mulheres de 18
(dezoito) para 9 (nove) anos de idade; a mulher só poderá pedir divórcio se
conseguir provar que o seu marido é impotente ou que seu órgão sexual foi
amputado; as xiitas iraquianas só poderão sair de casa, com autorização prévia
do marido; deverão estar sempre disponíveis para ter relações sexuais; além
disso, a lei incentiva a poligamia (por parte dos homens); visa banir o
casamento de muçulmanos com pessoas de outras religiões. De acordo com Hana
Edward, a secretária-geral da ONG Al Amal, que milita a favor da igualdade de
gênero, “esse projeto é doentio, e eu o considero crime contra a humanidade” e
acusa o governo de se utilizar desse projeto para atrair o voto conservador,
sendo esta uma jogada eleitoral antes do pleito parlamentar.
Nos países ocidentais
presenciamos, atualmente, grandes avanços quando se trata dos direitos da
mulher e a constituição familiar, olhando o panorama de um país como o Iraque,
é de se abismar o quão atrasado é a efetivação dos direitos do cidadão e, o
pior, ainda consegue sugerir um retrocesso ainda maior. A luta do lado esquerdo
do mapa foi árduo e milenar, hoje colhemos os frutos de batalhas constantes, é deplorável
ler notícias que entram em choque com todas as conquistas já alçadas e ainda
saber que a nossa sociedade já passou por esse período.
Diante dos embates
políticos e religiosos pelo qual o Iraque vive, é até difícil buscar uma
interferência eficaz para que se impeça que tal lei se efetive, é desejar que a
sociedade desperte para uma visão mais abrangente e que não se justifique os
posicionamentos ortodoxos e preconceituosos com a sua religião. O mundo é
outro, a sociedade é outra, as mudanças estão ocorrendo a todo momento, esta
lei não apenas rebaixa a mulher diante do homem, como também suga toda a sua
dignidade e a reduz a um objeto de satisfação do seu parceiro. Que ao menos
sirva como exemplo à nossa sociedade quando a mesma lidar com situações que
ferem à dignidade da pessoa humana e acabam passando despercebida ou
justificada com o livro sagrado.
*Texto publicado na versão impressa do Jornal de Fato de Mossoró-RN, na página 2, do dia 01/05/2014. Disponível em: Edição 3951
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